Cansados da espera pela retomada das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), moradoras e moradores da Estação dos Ventos, na zona leste de Santa Maria, realizaram uma manifestação na manhã desta quarta-feira. Com faixas e cartazes, adultos e crianças bloquearam a rua Augusto Ribas, uma das vias de acesso à comunidade que convive com as obras paralisadas desde outubro de 2012.
A manifestação iniciou às 7 horas da manhã, com o sol ainda invisível por trás dos morros que limitam a cidade ao norte. Motoristas, percebendo que a rua que atravessa os trilhos da via férrea estava bloqueada, desviavam sua rota para as vias laterais, enquanto moradores da vizinhança que cruzavam a pé rumo ao trabalho cumprimentavam os manifestantes.
“Mal feito”, diziam diversos cartazes empunhados pelos manifestantes, referindo-se à obra do PAC que foi interrompida há quase três anos, apresenta diversos problemas e deixa a comunidade com um cenário peculiar, composto de ruas sem pavimentação nem meios-fios, bueiros inutilizados acima do nível das ruas e esgoto a céu aberto. A isto, somam-se as pontes que não dão vazão ao rio que margeia o loteamento e contribuem para que, a cada temporal, enchentes tumultuem a vida de quem mora lá.
Outros cartazes, mais específicos, indicavam a insatisfação dos moradores com a situação que enfrentam atualmente: “ônibus não tem”, “luz…? só no gato”, “ruas só buracos”, diziam alguns deles, acompanhados por faixas que faziam referência à creche que é aguardada desde 2010.
“Estou aqui reivindicando meus direitos e os direitos da minha companheirada. Estamos ali isolados, vivendo no meio do buraco. Nós temos mesa comunitária no meio da rua, água é gato, luz é gato. Se incendeia uma casa, nós não temos bombeiros, porque eles não tem como entrar”, afirma Paula Gulart, moradora da Estação dos Ventos. “A gente vem lutando, vai fazer 15 anos que estamos aí. Ganhamos o dinheiro do PAC, e até hoje, só fizeram uma porcaria aí embaixo. Hoje, nós não queremos que ninguém mais nos cale, isso aqui é só uma amostra. O que fizeram com o dinheiro do PAC?”, questiona a moradora.
Tito, líder comunitário da Estação dos Ventos, conta que participou de uma reunião com a Prefeitura e o Ministério Público Federal (MPF) em 29 de janeiro deste ano, e que foi dado um prazo de 30 dias para a Prefeitura Municipal encaminhar as pendências necessárias para que as obras reiniciassem. Desde então, passaram-se cinco meses sem respostas nem providências.
Por isso, a comunidade reivindica uma reunião com a Prefeitura, o MPF, a Corsan, a Aes Sul, a Cotrel (empreiteira responsável) e o Núcleo de interação Jurídica Comunitária (Nijuc, que presta assistência jurídica à associação comunitária), para tratar da retomada das obras.
“Esse ato, na verdade, é só um termômetro da situação. A gente pretende intensificar e não parar até que alguma coisa aconteça, que as obras retomem ou que alguma data seja tirada para retomar”, afirma Tito. “São quase sete anos que as obras começaram e pararam no mesmo ano. Não houve uma retomada e nem tem uma resposta da situação para nós. Da minha parte, negociei várias vezes com a Prefeitura para que fossem retomadas as obras ou que nos dessem uma resposta que fosse satisfatória. Como nenhuma das duas coisas aconteceram, agora os próprios moradores estão forçando para que aconteça”.
A Estação dos Ventos originou-se de uma ocupação urbana realizada em julho de 2001,há quase 15 anos. Desde então, vem lutando pelo acesso a infraestrutura e a direitos sociais básicos, como o acesso regular a água e a luz. AS 286 famílias iniciais transformaram-se em 396 famílias que, segundo a Associação Comunitária, somam hoje um total de cerca de duas mil pessoas.
Em 2008, durante o governo de Valdeci Oliveira (PT) a Estação dos Ventos foi contemplada com um projeto do PAC que previa a instalação da infraestrutura básica na comunidade e, no ano seguinte, já sob a gestão de Cezar Schirmer (PMDB), a licitação foi concluída e a vencedora foi a empreiteira Cotrel. As obras iniciaram somente em 2012, ano de eleições municipais, e foram interrompidas em outubro, poucas semanas antes do pleito.
Outras necessidades da comunidade foram apontadas na manifestação, como a construção de um posto de saúde e de uma sede comunitária, a coleta de lixo em todas as ruas, a criação de linhas de ônibus – que, em função das obras interrompidas, nem conseguem acessar o loteamento – e a regularização do acesso a água e luz.
“A água da chuva também, tanto o esgoto cloacal quanto o pluvial, eles não têm uma definição de onde estão indo. A própria rua não nos dá uma dimensão de entrada e saída. Ou seja, hoje nós estamos ilhados dentro da comunidade”, destaca Tito. O líder comunitário cita de cabeça o valor exato que foi destinado para a obra do PAC na comunidade: R$ 5.061.428,84.
“É dito aí que esse valor acabou. Mas, se a gente considerar o que foi feito, e da maneira como foi feito, não tem como aceitar que o dinheiro foi gasto nisso. Então, a gente quer resposta pra isso. Não é o ‘presidente da vila’ que quer isso. É a comunidade que quer isso”.
A revista o Viés já fez outras duas matérias sobre a situação da comunidade da Estação dos Ventos. Acesse nos links abaixo:
As soluções viraram o problema, de abril de 2013;
Na Estação dos Ventos, a situação é a mesma há anos, de novembro de 2014.
Manifestação na Estação dos Ventos: “nós estamos ilhados dentro da comunidade”, pelo viés de Tiago Miotto