Em 2012 era lançado Jeito Felindie, justa homenagem a um dos grupos mais expressivos do pagode anos noventa do Brasil. O Raça Negra, com mais de trinta anos de carreira, embalou romances, ajudou a superar “dor de corno” e fez todo mundo dançar de rostinho colado com seu pagode romântico.
As letras do grupo não eram políticas em um sentido estrito do termo “político”, mas refletiam de certa maneira um período marcado pela ressaca do pós-ditadura, a “Nova República” de Sarney e a abertura neoliberal de Collor, Itamar e FHC. O Raça Negra representava o que um imenso contingente de brasileiros sentiam em uma busca cada vez mais centrada no indivíduo, o que em parte ajuda a explicar as dificuldades de organização coletiva daquela época.
Da mesma maneira, o disco Jeito Felindie, projeto capitaneado pelo jornalista Jorge Wagner e disponibilizado no sítio Fita Bruta em outubro de 2012, é também um pouco do sentimento de uma geração com grande tendência à nostalgia até do que não viveu. Assim, os óculos do vovô, o chapéu da vovó e as roupas do brechó são elementos de reafirmação no grupo – pouco definido e cheio de microrramificações – dos indies. Não é o caso de juízos de valor estéticos, mas da demonstração de que o indie carrega consigo uma geração que, vinda de lares mais confortáveis do que seus pais e avós tiveram, se veem sem grandes perspectivas de futuro já na juventude – o que contribui para explicar esse sentimento nostálgico.
Dessa forma, nada mais justo do que uma homenagem a um grupo que marcou a infância/pré-adolescência/adolescência dessa geração atualmente com poucas perspectivas. É pura memória afetiva. E não de uma maneira ruim, pelo contrário. É a memória afetiva de um tempo mais lento – e de computadores (Windows 95) e internet (discada e só no domingo) igualmente vagarosos – em que a perspectiva podia ser muito bem ter uma “vida cigana” e pronto! Relembrar os sucessos por outras vozes em Jeito Felindie é, sobretudo, um convite para de novo se embalar na cadência do mais constante grupo de pagode dos anos noventa.
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RAÇA NEGRA INDIE: DA FALTA DE PERSPECTIVA À MEMÓRIA AFETIVA, pelo viés de João Victor Moura
*esse texto não tem nem de longe a ambição de definir longamente a geração atual, mas se você quiser saber mais sobre ela pode dar uma olhada nos textos a seguir:
“Gente de humanas que faz um monte de coisa que não dá dinheiro”
“Porque os jovens profissionais da geração Y estão infelizes”
“O desemprego juvenil e a crise social no Brasil atual”
“Sorriso de monge, carteira de yuppie”