No último dia 5, a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara de Deputados aprovou o PL 478/07, mais conhecido como “Estatuto do Nascituro”. Em resposta ao texto que prioriza os direitos do embrião à vida da mulher gestante, diversas manifestações ocorreram a nível nacional em repúdio a mais um projeto político que ataca a autonomia das mulheres sobre o próprio corpo.
Em Santa Maria não foi diferente. Cada vez mais articulada e mobilizada em torno das pautas feministas, a Boca do Monte esteve, no último sábado (15), ao lado de cidades como Recife, São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre realizando um ato seguido de debate público na Praça Saldanha Marinho. A partir das 10h, no coreto, se iniciaram a confecção de cartazes e panfletagem, convidando as pessoas a participarem da discussão no início da tarde.
O sol começou a aparecer no mesmo ritmo em que as meninas do batuque desciam o calçadão entoando músicas e palavras de ordem, despertando a atenção das pessoas que andavam por ali. Entre passos mais curtos e pausas, um jogral também anunciava a disposição que o movimento tinha em dialogar com a população sobre o Estatuto e os equívocos constitucionais representados por ele.
“Bolsa estupro, não quero, não! Estuprador é na prisão!”
Um dos pontos mais polêmicos do projeto de lei é o artigo 13°, que consente com a violência sexual, no sentido em que o nascituro fruto de um estupro terá todos os direitos assegurados, ignorando completamente o abuso físico, psicológico e emocional sofrido pela mulher. Além disso, se o pai for identificado, terá de ser registrado na certidão de nascimento e obrigado a pagar pensão alimentícia até a criança completar 18 anos de idade; caso não for identificado, o Estado fica responsável por esse pagamento. Ou seja, a mulher terá que conviver com o fruto de uma violência ao seu próprio corpo, porque o Estado estará defendendo exclusivamente os direitos daquele conjunto de células concebido, que ainda vai nascer.
“Eu não aturo, eu não aturo o Estatuto do Nascituro! Eu não me engano, eu não me engano, é a mulher em segundo plano”
Resumidamente, todo o texto do Estatuto prevê a extinção da prática do aborto, uma vez que dispõe a proteção integral ao nascituro. Assim, inclusive nos casos de gravidez de risco, o direito à vida do embrião estará na frente dos direitos da mãe. Para explicar e esclarecer as dúvidas sobre o texto do projeto, três pessoas foram convidadas a iniciarem o debate de ontem: Gabriel Porto Dutra – advogado, Laura Ferreira Cortes – enfermeira e Vânia Fortes de Oliveira – psicóloga. Ao colocarem questões que perpassaram as áreas da saúde e da legislação jurídica que o texto do projeto infringe, o microfone foi aberto para demais intervenções feitas por quem acompanhava o ato. A palavra uníssona escutada durante toda a manifestação foi “retrocesso”, uma vez que o Estatuto deslegitima, inclusive, vitórias já conquistadas pelas mulheres brasileiras (exemplo do direito ao aborto conquistado em 2012 para casos de fetos anencéfalos).
Reunindo cerca de 350 pessoas, mais uma vez a Marcha das Vadias incentivou a ocupação dos espaços públicos para discutir política e conversar com a população santa-mariense a respeito de pautas feministas. O movimento organizado e as manifestações trazem esperança para a reivindicação diária de um Estado verdadeiramente laico, que garanta às mulheres total liberdade de decisão sobre seus corpos e igualdade de direitos em qualquer instância da sociedade.
NEM ESTADO, NEM IGREJA, QUEM DECIDE É A MULHER, texto pelo viés de Marina Martinuzzi e fotos de Marina Martinuzzi, Carolina Bonoto* e Nathália Schneider**.
*Estudante de jornalismo na UFSM e do curso de direito na UNIFRA
**Estudante de publicidade e propaganda na UFSM e integrante da Casa Fora do Eixo de Santa Maria