A chegada ao Pira Rural permite a esplêndida visão de fazendinha, com o sol batendo na grama verde do sítio e suas vacas. Abanos e chamados indicavam que o caminho para o festival era aquele.
Agricultura familiar total e moeda complementar total: o dia se inicia com almoço bem servido, vegano ou colonial, ficando à escolha de quem levou seu prato e seus talheres (e para quem não os levou, a cozinha do Pira disponibilizava a louça). Todos os alimentos e as bebidas vendidos no Pira são produzidos pela agricultura familiar presente na região. Cachaça, graspa de mel, vinho, suco de uva natural (naturalíssimo), somavam ao menu de bebidinhas mágicas para elevar, embriagar ou saciar o âmago dos dionisíacos.
Teve até ‘sopa pá nóis’ na madrugada de sábado. Feita por várias mãos, hidratou a festiva reunião, fazendo dobradinha com o ‘pão com moio’, ou com o pastel, ou ainda com aquele delicioso sanduíche para o café da manhã. Tudo isso cambiável pelos Piras, moeda complementar do Pira Rural, uma prática que demarca o território da contestação ao modelo vigente de valoração do trabalho humano, o vil metal.
Estrutura de festival, metodologia do amor: em termos de estrutura, percebemos que a organização investiu em aprimorar detalhes negativos observados durante a edição do ano passado. Os banheiros são um capítulo à parte de qualquer falatório. O Pira propôs o exercício do dever cidadão de cuidado com a água, no seu abuso e uso. A falta dela era elementar ao que nós, humanos, deveríamos exercer: a nossa criatividade e o nosso senso de comunidade. O ‘meu’ banho se tornava mais amplo e a cascatinha oferecia o banho coletivo e gelado, com gosto de beijo aquático! A gestão dos banheiros, sob responsabilidade do Duda (que mereceu inclusive homenagem no sábado), é algo a ser levado muito a sério como modelo de sustentabilidade de festival.
Após o almoço, deparamo-nos com uma estrutura muito inteligente.Uma pia feita de bambus, onde o ato agradabílissimo de lavar a louça se somava à partilha daquele momento com algum desconhecido – bom momento para uma conversa.A programação do festival girava em torno da Rádio Camarim, tocada pelo Gustavo, promovendo interação com o público e com as bandas, além de muita música boa.
Turismo Rural e Aproximação com a comunidade de Ibarama: uma das principais ações do Pira Rural 2013 foi a visita à propriedade dos agricultores Mário e Remilde Raminelli, uma experimentação de turismo ecológico, algo novo na região. Foi muito lindo. É o casal que ‘sistematiza e articula’ a plantação de infinitas espécies de plantas em 13 hectares de terra. Cana-de-açúcar, fumo, milho, laranja, caqui, goiaba, mandioca, amendoim, ameixa, erva-mate…Tudo lá, tomando conta da terra em conexão com a ordem da natureza. E eles ainda estiveram no Pira Rural para conhecer o espaço e a galera também.
A aproximação da comunidade ao festival estimula ainda mais a execução de projetos interligados com necessidades locais, fortalecendo a cidade e sua gente. Desmitifica também a figura do jovem, inserindo-o nos processos comunitários. Essa ação também promove o turismo rural para Ibarama, uma possibilidade real e economicamente viável, uma vez que o lugar é lindo e é berço de experiências e figuras magníficas.
Bandas e Brindes: quanto à música, só podemos dizer que o Pira foi muito bem brindado, entre bandas de rock e vertentes diversas. Desde o memorável show da Sapo Jones &Coyote Bill próximo à Cascatinha até os mais de dez shows que rolaram no Palco Pira, todos dançaram às baladas autorais, que passearam entre psicodelia, blues rock, quebras progressivas e climas caipira-folk. Talvez pareça injusto destacarmos somente alguns shows, mas fica registrado aqui o nosso grande apreço pelas bandas Quarto Sensorial e Sopro Cósmico, formadas por grandes músicos, ótimas pessoas também, além de Saturno de José e a incrível banda Cabeçote, de um pessoal muito bacana e solicito de Curitiba, que reuniu além do show, retroprojetor com várias imagens doidas.
As bandas da região da serra fizeram bonito no Pira: três bandas da região da serra tocaram no Pira Rural 2013. A Célula, banda do eixo Caxias-Farroupilha, apresentou um show bastante preciso, com interações bacanas de visual, música e conversa. A Mahabharata abriu os shows que aconteceriam no sábado, com uma apresentação sóbria, com espaços e silêncios que permitiam uma impressão em terceira dimensão do som. A Velho Hippie, antecipando o lançamento do disco Flor Lilás, que será lançado entre abril e maio, com vários shows na rua, fez uma grande apresentação, com uma montagem especial no palco Ricas Abóboras.
O Manifestasol Coletivo esteve presente realizando algumas ações específicas, frutos da parceria com o festival, que surgiu em 2011, e segue, cada vez mais, coração e integração. Para o festival, levamos a banquinha com produtos de bandas independentes, junto ao material da DistroFdE e Marias Lavrandeiras, incluindo também lançamentos especiais das bandas Velho Hippie e Saturno de José (CDs, camisetas e até panos de prato!).
Além disso, o Manifesta esteve na gestão da equipe de mídia, que se ocupou de produzir um documentário sobre o festival, a ser lançado em breve, além de intensa cobertura fotográfica, registros que já estão postados no perfil do Pira Rural no Facebook. Além disso, algumas falas e entrevistas foram realizadas na Rádio Camarim, que esteve presente ininterruptamente nos três dias de festival!
Entre muitas ações envolvendo arte livre, oficinas terapêuticas, vivências diretas com a natureza e muita música autoral, podemos destacar a imensa particularidade do Pira Rural: do início ao fim do festival, todos pareciam se sentir em casa e esse sentimento parecia estar presente na maioria das pessoas, que reconheciam um ao outro como velhos amigos. Talvez isso parta da própria forma com que a organização gera o festival, com muita sensibilidade e empatia. Isso faz do Pira Rural um festival modelo, em questão de boa receptividade e gestão adequada aos moldes e ao tamanho proposto. ‘Uma pena que terminou’, era o sentimento geral. Valeu, Cascatinha!
PIRA RURAL 2013: A CASCATINHA É MUITO AMOR!, pelo viés do colaborador ManiFestaSol Coletivo. Fotos de Calvin Furtado.