Sou do tempo que classe C era composta por empregada, professores que se vestiam mal e (coitados) precisavam ir para escolas particulares enfrentar a sagacidade de alunos mimados e por pessoas que falavam “quedele” no lugar de cadê. Desde esse tempo todo mundo estava enganado.
Só que esse tempo mudou. Ou não, como diz todo o pseudointelectual classe C.
Mudou porque não se fala em outra coisa que não seja a ascensão da classe, do efeito Lula, da glória do Divino da novela em HD e da profissão do momento: empreguete.
Ou não! Porque, vamos combinar: não mudou muita coisa assim!
Fico um pouco constrangido com esse over aparecimento da classe C, que não diz quase nada. Com essa nova mania das empresas que precisam entender a classe C. Entender o quê?
Em primeiro lugar, a classe C, economicamente falando, é a maioria do país e não um clã de índios que mora pra lá do ABC paulista.
Em segundo porque, para entender, é preciso se igualar e não apontar o dedinho com nojo!
E em terceiro, e não menos importante, porque todo e qualquer brasileiro é bem classe C e tem gostos de pobre. A Tiffany no Brasil é a única do mundo que parcela, quase assim como o crediário das Casas Bahia. Só que brasileiro não se admite e segue vivendo num efeito Caco Antibes, com horror de pobre.
Não questiono ninguém “odiar pobre”. Cada um odeia quem quiser. O que questiono é uma frase, que ouvi há muitos anos atrás [e não sei de onde saiu], que diz que o “bom gosto é sempre muito parecido com o nosso”. E quem odeia pobre também compra em prestação e adora o cajuzinho da festa do clube, que não é igual ao de pobre, claro. E assim, ninguém vê que de médico e classe C, todo mundo tem um clichê.
O Brasil é um país com uma gigantesca pluralidade cultural que nem a gente conhece e acho que isso é o que ele tem de melhor para oferecer ao mundo [ que não para de olhar para cá]. Só que isso é o que ele menos oferece para ele mesmo, pois pasteuriza tudo, como coisa de pobre ou coisa de rico. Como cafona e com o não cafona. Só que se esquece de que o cafona é o que há de mais in e rico por aqui!
Tem aquele livro que diz que o mundo é plano e que com a globalização estamos todos iguais. Bem, bem parecidinhos. Tudo bem. Concordo que o mundo é plano, mas que ele tem umas quebradas, ah, ele tem! E isso me faz fazer um link com o que acho mais crucial para essa analise: uma palavrinha chamada cultura.
Todos sabemos que a cultura existe para dominantes e dominados e que aí, sim, quem manda é quem tem mais poder. E que nesse quesito, não se discute, se lamenta, assim como gosto! O Chacrinha dizia muito bem isso, quando comentava que quem gosta de pobreza é intelectual porque pobre gosta mesmo é de riqueza. Aí que a coisa complica, já que vivemos em um país multicultural, multirracial, plurirreligioso que está sendo pasteurizado com a cara do Divino. Tem muito mais, gente! Tem muito mais coisas para mostrar. Quedele o hip hop de raiz? Quedele as iniciativas legais? E a alegria de viver? E o pior: quedele o Leblon? É o que clamam alguns “índios integrantes da classe C”.
Quedele o bom gosto? Será que ele é muito parecido com o nosso para ser classe C?
Infinitamente mais importante que apresentar a classe C na novela de maneira sensacionalista é entender que o Brasil é classe C e que isso é o mais legal que ele pode oferecer para quem quiser ver. Que isso é criatividade, e mais, que isso é a nossa cultura!
Eu adoro a novela e acho que isso pode ser um começo para ir além e mostrar o pouco de tudo que temos nesse mundão gigante chamado Brasil. E que talvez, só assim, mostrando o bom gosto do Brasil, a nossa cultura se eleve um pouco.
E o nosso ego de não pertencer a nada disso, baixe bem mais!
Fui lá ver a Carminha! E quedele a minha mega TV que não chega?!
QUEDELE O MUNDO PLANO?, uma crônica pelo viés do colaborador Cássio Prates*
*Cássio Prates é publicitário