Mais do que um drama que retrata o começo de uma transformação da sociedade estadunidense, principalmente pela forte influência Martin Luther King na luta pelos direitos civis dos negros, Histórias Cruzadas é um filme sobre coragem e tomada de consciência.
O longa-metragem Histórias Cruzadas, lançado em fevereiro deste ano no Brasil, é baseado no Best seller homônimo de Kathryn Stockett. O filme dramático retrata a vida das mulheres negras que viviam em Jackson, cidade no estado do Mississipi, nos Estados Unidos dos anos 60. Essas mulheres eram empregadas domésticas e, muito mais do que limpar a casa e cozinhar, elas criavam os filhos de suas patroas que pensavam apenas em roupas e em se consolidar na alta sociedade. O ofício era passado de mãe para filha, ai de quem fosse filha de doméstica e se negasse a ser também. O instinto de propriedade com o qual os patrões tratavam as domésticas negras era encarado com muita naturalidade nos Estados Unidos, até que uma jovem escritora chamada Eugenia volta para Jackson, sua cidade natal, e decide escrever um livro de relatos da perspectiva das empregadas domésticas. Eugenia sempre tratou a governanta de sua família como uma mãe e abominava a ideia de superioridade caucasiana.
Contudo, a escritora não consegue convencer as domésticas a contarem suas histórias sobre e sob o racismo vivido diariamente, pois se suas patroas soubessem do livro, poderiam castigá-las violentamente e, além disso, incitar qualquer tipo de ideia de igualdade de raça, na época, nos Estados Unidos, era considerado crime.
A primeira mulher que aceita participar do livro, então, é Aibileen Clark, interpretada por Viola Davis, indicada ao Oscar por melhor atriz. Aibileen é uma mulher solitária que teve o filho atropelado e, logo em seguida, jogado na porta do hospital dos negros. Sem atendimento, o filho de Aibileen morreu sem seus braços. Logo em seguida, sua melhor amiga Minny Jackson, interpretada por Octavia Spencer (vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante), decide participar do livro também, após ser demitida por sua patroa e surrada por seu marido. Não suficientemente humilhada pelo preconceito racial diariamente, Minny também convivia com o machismo que imperava em sua casa. Paralelamente às mulheres negras, casadas que estavam à mercê do patriarcado, a jovem escritora Eugenia era pressionada por sua mãe e por suas amigas a encontrar um marido, algo que não estava nos planos da moça, mas ser solteira era algo mal visto pela sociedade.
Não demorou muito para as outras domésticas tomarem a consciência de que servir aos brancos, frequentar escolas diferentes e se submeter a humilhações diárias, como ter que usar um banheiro exclusivo para não transmitir doenças que os brancos achavam que só os negros tinham, não poderia ser seu destino.
O livro foi publicado e teve como título a expressão em inglês “The Help” que é o título original do filme e significa “a ajuda”. O título original traz diversos sentidos: de pessoas quase escravizadas tratadas como ajuda pelos brancos. Da necessidade de ajuda por mais direitos civis. E, também, como o próprio auxílio dado por diversas empregadas ao livro de Eugenia mesmo com medo de represálias.
Os homens quase não aparecem no filme, as mulheres brancas pertencentes à alta sociedade da cidade e as mulheres negras que serviam suas patroas roubaram a cena. O longa-metragem conta com uma trilha sonora impecável, a qual inclui Bob Dylan, Ray Charles e Chubby Checker. Além disso, um filme com 17 indicações a prêmios internacionais e com 1 Oscar é realmente imperdível.
AS NEGRAS DE JACKSON E UM LIVRO, pelo viés da colaboradora Letícia Fontoura.