“Acusavam-no de ser instável no modo de julgar os homens e manejar a história, de combater Fernando VII e se abraçar com Morillo, de fazer a guerra de morte contra a Espanha e ser um grande promotor de seu espírito, de se apoiar no Haiti para ganhar e depois considerá-lo um país estrangeiro para não o convidar ao Congresso do Panamá, de ter sido maçom e ler Voltaire na missa mas tornar-se um paladino da igreja, de cortejar os ingleses enquanto pretendia se casar com uma princesa da França, de ser frívolo, hipócrita e até desleal, porque adulava os amigos na presença deles e os difamava pelas costas.
– Pois bem, tudo isso é certo, mas circunstancial – disse – porque tudo eu fiz com o único objetivo de tornar este continente um país independente e único, e nisso não tive nem uma contradição, nem só uma dúvida.
E concluía a seu jeito:
– O mais é sacanagem!”
Gabriel García Márquez já era um ganhador do Nobel de Literatura e um renomado escritor quando, em 1989, lançou “O General em seu labirinto”. Nos “Agradecimentos” da edição brasileira do livro García Márquez confessa que a ideia de narrar os últimos dias de Símon Bolívar, em especial a última viagem que fez, pelo Rio Magdalena, não fora sua, mas de Álvaro Mutis, seu amigo, poeta e escritor. Passada uma década Álvaro não concretizava sua ideia e García Márquez achou por bem pedir autorização ao amigo para que escrevesse a história.
Com pesquisa prévia e com a imaginação que lhe reservaria lugar cativo entre os mestres da literatura o autor colombiano nos faz viajar ao lado de Símon Bolívar, general libertador que, ao lado de José de San Martín, seria responsável pela independência da América espanhola e que tinha como sonho unir o continente em um único país. A história de Bolívar é interessante, com seus começos e recomeços, mas seus dias finais são de dor e sofrimento. O general está esgotado. E García Márquez traz ao leitor exatamente essa sensação.
“O general em seu labirinto” não tem maior pretensão que essa, descrever o fim de um dos homens mais importantes da história latino-americana, e o mostra como mais um ser humano, preocupado com sua barba mais do que com sua saúde, que se ocupa da nova ofensiva integralista contra os movimentos separatistas, mas que não consegue nem se levantar por muito tempo sem que terríveis dores o aflinjam. García Márquez relata a morte de um homem imortal, que mesmo com todos os defeitos, com todos os “poréns”, seguirá inspirando povos em suas lutas contra a opressão e a tirania.
O GENERAL EM SEU LABIRINTO, pelo viés de João Victor Moura
joaovictormoura@revistaovies.com