“O filho da noiva”, de 2002, é um bom exemplo de estilo de cinema mais íntimo, mais próximo do cotidiano comum, adotado em variadas produções do país vizinho, que vem angariando simpatia do público há bastante tempo e repercussão internacional em festivais. Um majestoso drama sobre almas, onde as relações entre pai, filho e mãe são demonstradas através de takes ora simples, ora muito bem compostos, como uma briga real da história dentro da cena de um filme fictício.
Ricardo Darin já se transformou em um símbolo do cinema argentino e tal fama não veio de graça. Assim como em “Clube da Lua”, apenas os trejeitos e o estilo de Darin conseguem passar para o espectador toda aquela angústia que a personagem sente. A companhia de Eduardo Blanco em ambos os filmes cria também um imaginário perfeito, uma dupla que em cena se dá muito bem.
Entretanto, em “O filho da Noiva”, quem levou as láureas fora a atriz Norma Aleandro no papel da mãe com Mal de Alzheimer. O olhar distante e a fragilidade que a atriz corrobora na personagem rasgam o filme em cenas chocantes de agonia. Norma Aleandro em silêncio por dezenas de minutos e com frases repetidas conseguiu levar o Kikito de Melhor Atriz pelo papel. A mãe que sofre de esquecimento e que vive agarrada a um ursinho de pelúcia arremata a emoção de qualquer um. A relação entre a mãe descontente com a troca de profissão do filho, o pai, que quer realizar o casamento religioso dos dois aos setenta anos, e do filho Rafael Balvedere, profissional dono de um restaurante que enfarta por estresse, fazem de “O filho da noiva” uma história tão comovente que se torna inesquecível.
Esse estilo de cinema, com histórias intimistas e ao mesmo tempo universais, nem sempre agrada ao grande público, que lota as salas de cinema quando os motes são grandes cenas com helicópteros, bombas e capitães Nascimento. Entretanto, para os amantes de boas histórias cotidianas, vale conferir o desfecho do filho, do esposo e da noiva.
O cinema argentino levou o Oscar em 2010 e se seguir com a safra valiosa de películas pode levar ainda muitos outros. Como já indicado na “Estante” do Viés, assista também a “O segredo dos seus olhos” e “Buenos Aires 100 km”. O segredo de tais tramas sem dúvida abarca a delicadeza de tratamento de temas simples e a naturalidade de contar sem muitas delongas. Outras dicas de filmes no estilo, não apenas vindas dos nossos hermanos, são “Não por acaso” (brasileiro), “A casa de Alice”, também nacional, e “Lugares Comuns”, película argentina que merece um espaço na “Estante” logo, logo.
Uma peculiaridade que não pode passar em branco: com medo de não alcançar a perfeição cênica em representar uma senhora com Alzheimer, Norma Aleandro fora convidada pelo diretor do filme, Juan José Campanella, para dar uma volta de carro acompanhados da mãe de Campanella, portadora do Mal de Alzheimer. Nós podemos nem saber o que se passa na mente de quem possui a doença, mas Norma Aleandro cunhou a aflição só no olhar vago de quem nem imagina o que se passa ao seu redor.
Filme: O filho da noiva Ano: o mesmo de Durval Discos Direção: o mesmo de “O segredo dos teus olhos“ Elenco: Ricardo Darín, de “O segredo dos teus olhos”, Norma Aleandro, Héctor Altério, de “A história oficial” e Eduardo Blanco, de “Clube da Lua”.
O FILHO DA NOIVA, pelo viés de Bibiano Girard