“de que serve a inteligência se não para servir?”
Em tempos de crise econômica mundial, em que a Grécia pede socorro para a Europa, e la gran Europa não sabe o que fazer – ou não tem o que fazer.
Em tempos de muito mimimimi para nada, que falar em tempos já é ultrapassado e já entra em crise, quero só contar uma história.
Uma história, em tempos que o Robin Hood volta aos cinemas numa-super-produção-mostrando-que-o-cara-ajuda-os-pobres-e-todo-mundo-sai-do-cinema-chocado-e-achando-aquilo-tudo-lindo, né?
Quero contar uma história, em tempos que a inteligência é super valorizada, mesmo que ninguém saiba o que fazer com ela.
Uma história que talvez nem seja muito inteligente, mas que, ao menos, serve para pensar, e não para acumular.
A história que contarei chamar-se-á história do Robin Hood de los bancos. O Robin, no caso, se chama Enric Duran, não saiu de Hollywood e mostrou a crise no melhor estilo just do it.
O cara é catalão e nasceu numa cidadezinha perto de Barcelona. Dedicou a infância e a adolescência ao tênis de mesa, esporte que, segundo seus amiguinhos, era um gênio. Depois foi estudar sociologia em Barcelona, onde morou com a mãe e com os irmãos desde pequeno. Abandonou a faculdade e dedicou-se, então ao seu grande plano.
Dizem por aí, que o cara estudou fundo todo o sistema econômico da Europa, e principalmente da Espanha para realizar a sua desobediência civil capitalista, como ele mesmo chama o seu feito.
Bom, Enric Duran, durante os anos de 2006 e 2008 conseguiu o maior número de empréstimos possíveis em diferentes bancos espanhóis, até que, quando estava com a grana toda na mão, se lançou como um ativista anti-capitalismo e disse: – “quer saber? Não vou pagar. E quer saber mais? Vou explicar o porquê”.
Então ele escreveu o artigo “Eu roubei 492,000 euros de quem mais rouba das pessoas”, explicando toda a sua operação, detalhando cada um dos bancos que ele pediu empréstimo – foram 68 bancos no total – e fazendo aquela velha critica ao sistema capitalista, mostrando toda a vulnerabilidade do sistema, onde quase ninguém consegue ter essa grana durante uma vida inteira de trabalho, mas ao mesmo tempo esse dinheiro pode ser muito fácil de se conseguir através do sistema bancário, e das (altas) tributações a serem pagas por ele. Ou, em menos palavras, que os bancos mandam em todo o sistema econômico e político de um país e são grandes responsáveis por todo esse caos desigualitário que vivemos em qualquer parte do mundo.
Depois de mostrar tudo isso, ele apresenta maneiras diferentes de se viver e – principalmente – de se envolver, em modos de sobrevivência alternativos ao sistema capitalista .Um soco no estômago que te faz pensar pra caralho,não?
Eu acho.
Bom, mas continuando a historinha, e esclarecendo o que muitos devem estar pensando sobre onde todo esse dinheiro foi parar?
Enric usou a bufunfa de duas maneiras: distribuiu esse dinheiro para algumas organizações que buscam alternativas ao sistema capitalista – as quais ele não divulgou o nome para que não houvesse nenhum problema de devolução do dinheiro aos bancos – e com outra parte do dinheiro, ele imprimiu a revista Crisi (que ele mesmo produziu) – onde se encontrava o artigo que falei antes e mais uma serie de opções anti establishment, esclarecimentos bancários e critica ao sistema atual.
A revista foi distribuída por toda a Europa e dizem por aí, que teve mais audiência que o La Nación no dia que circulou pela Espanha. Dizem também, que essa revista foi construída por mais ou menos uns 200 colaboradores que ajudaram Duran ao longo desses dois anos e pouco, e que essas pessoas assinavam com pseudônimos para não colocarem a cara no gatilho. Um desses pseudônimos, corre na boca pequena, era um amigo brasileiro de Enric e participante do MST. Mas isso é o que dizem, vai saber.
A revista pode ser lida no site , em diversas línguas, assim como, Enric tem um blog.
Finalizando a história, obviamente o cara foi condenado. Mas o interessante é que ele não foi condenado pela grana e sim por falsificação de um ou dois documentos que foram necessários para que ele conseguisse todo o montante. E dai toda a história a la Robin Hood se repete. Hoje ele está solto. Dizem que ele está na América e que o movimento continua crescendo bastante e brevemente a revista terá mais algumas publicações. Quem viver verá.
Enfim, acho que toda essa história vem em uma boa hora e serve se não para fazer, para pensar. Não estou dizendo que a partir de agora a galera precisa sair roubando bancos para dizer que fez alguma coisa – OBVIO QUE NÃO. Mas, como já disse antes, acho uma baita história para se pensar, não o que estamos vivendo – que isto está bem evidente para todo mundo – eu acho, mas porque estamos vivendo tudo isso e de que maneira podemos fazer por isso.
Para mim, essa história é um belo exemplo de um pensamento que foge dos muros da escola, que não simplesmente acumula informações, mas que relaciona e usa-as como uma tentativa de solucionar. Mais uma vez: não acho que isso tenha solucionado nada, nem que vá solucionar, mas acredito que é uma maneira de gritar por todos que são calados. Uma maneira de pensar, eu diria, até mesmo na arte, e qual o significado da arte, se não gritar.
Acho que mostrar para as pessoas como os bancos funcionam, como são grandes e facilmente burlados, mostrando isso efetivamente, é uma puta forma de arte.
Uma maneira de despertar um gene adormecido em todos em nós, que a ciência já antecipou com as células-tronco, um gene que está parado, mas que pode trazer a solução. E não acumula simplesmente. Mas soma, ou melhor, relaciona informação para chegar a uma solução. No melhor estilo just do it.
E de que serve a inteligência se não para servir?
Para cuspir “inteligência”, apresentando questões fragmentadas dentro, em um mundo que pede questões planetárias? Para não sair de dentro dos muros (da escola) onde nada é interrompido pela vida real e todas as soluções são apresentadas em livros puramente teóricos banhado de arrogância e sabedoria meramente acumulada?
Como disse o poeta, “Prefiro um monge esclarecido a um intelectual pós-moderno.”
Prefiro um ladrão do bem.
ROBIN DE LOS BANCOS, pelo viés do colaborador Cássio Prates, estudante de Publicidade e Propaganda da ESPM-RS.
Para ler mais reportagens acesse nosso Acervo.
Cara, que genial essa história.
Por sinal, faço teatro e me dá uma vontade de contar ela no monólogo que a academia me obriga a levantar esse ano.
Sem dúvida, partilho da idéia de fazer da arte um grito e quero muito gritar, sutilmente é claro, se não alguém vai me censurar (sabe como é, tem que ser belo, plástico, etc…)
mas mesmo assim, vou denunciar pro espectador essa passividade toda que com a qual levamos nossas vidinhas medícores e nossas existências dominadas.
não ao acúmulo, não ao consumo, sim ao apocalipse de toda essa ilusão que nos conforta e conforma diariamente.
O templo do homem moderno é o shopping center, onde o pecado é não pagar o cartão de crédito. Apocalipse Já!
muito obrigada por fortalecer esse grito!