A programação da Semana da Consciência Negra em Pelotas, assim como em algumas outras cidades do país, contou com palestras e seminários relacionados à questão, mostras de obras e de filmes, concursos culturais e de beleza afro, apresentações de danças (com os grupos Grupos de dança Renovação, Trem do Sul, Companhia da Dança Afro Daniel Amaro, AfroPel) lançamentos de livros e torneio de futebol, entre outras atividades.
No dia 20 de novembro, dia oficial da consciência negra, de Zumbi dos Palmares e também o último da programação, um palco foi montado ao largo da antiga estação férrea em Pelotas. A partir das 14 horas, quem foi lá pôde assistir a grupos de música, principalmente de rap, e a artistas, que grafitaram paineis ao longo do evento. Cada grupo apresentava em torno de duas músicas e dava lugar ao próximo. Os grupos de rap representavam, em sua maioria, as zonas periféricas da cidade de Pelotas. Os bairros Dunas, Simões Lopes, Pestano e Navegantes, entre outros, estiveram presentes na voz dos cantores e nas letras, que apontavam as dificuldades de se viver em zonas praticamente esquecidades pelo poder público.
O público, apesar de pequeno, sinalizava a grande valia que a música, em especial o rap, tem na vida – e na luta pela vida – para aqueles que vivem o que as músicas e letras cantam. Antes do nome mais conhecido do dia entrar, outro músico, que toca pelas praças e ruas de Pelotas, chamou atenção. O músico da vassoura (ver na quarta foto “de baixo para cima”), junto com um grupo de baixista, trompetista e bateirista, apresentou suas composições irônicas e divertiu os presentes, se divertindo ele mesmo com as piadas (muito sãs, na verdade) que contava. Entre as várias críticas em forma de música e sátira, falou dos problemas das autoridades de uma cidade que não fomentam a cultura – e, principalmente, os nichos de cultura das minorias – mas que gasta rios de dinheiro com a Fenadoce (feira de doces tradicionais que acontece na cidade). Dizia: “Não me venham com rapadura e quindim, nós queremos cultura!”. Terminou dizendo: “Se alguém quiser ouvir o repertório inteiro, estou fazendo uma turnê pelas ruas de Pelotas. Podem ir lá deixar uma moedinha”.
No encerramento do show, o rapper GOG apresentou-se. Antes de iniciar, circulava entre todos conversando e trocando experiências sobre a dificuldade de se ganhar a vida com o rap e sobre os problemas que os negros sofrem na sociedade. Quando subiu, o alvará de licença para uso do local quase estourava. Contrariado, falou sobre os escassos espaços que o movimento negro e o rap têm para manifestar sua cultura e compartilhá-la. E seguiu cantando. Com as músicas, troxe a voz da revolta, da honestidade e da luta que se trava dentro das periferias para seguir em frente. Falou sobre a falta de oportunidades que levam muitos jovens ao crime e disse ser o rap um instrumento de contestação e de “fazer a revolução” para essas pessoas. “Rap nacional é o terror que chegou”, cantou, e depois conversou com os “parceiros”, falando sobre as opressões do modelo de sociedade em que vivemos e do medo que têm os poderosos de revoltas daqueles que são deixados de lado no sistema.
GOG ainda cantou duas músicas praticamente inéditas, as quais tiverem inspiração em acontecimentos nas cidades gaúchas de Canoas e Porto Alegre. Chamou uma pequena rapper, Vitória, de 11 anos (e que canta desde os seis) para o palco e falou sobre as gerações de rap que, para ele, não evoluem de trás para frente, mas sim representam um contínuo processo da música que passou de avô para pai e de pai para filho. E assim, conversando e cantando, GOG encerrou a tarde do 20 de novembro. Junto com todos os grupos que construíram o evento, plantou muitas ideias, lutas, revoluções e esperanças na cabeça dos presentes.
DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA EM PELOTAS, pelo viés de Liana Coll.
lianacoll@hotmail.com
Eu estive presente com minha familia foi muito bom,todos estão de parabens.Valeu!as fotos e reportagem estão muito boas.parabens a revista viés susseso a vocês.
Beleza de matéria, Liana. As fotos estão muito bonitas.
Uma das coisas que tem me agradado n’o Viés é que vcs estão se especializando em cumprir com o objetivo benjaminiano de “escovar a história a contrapelo”, isto é, mostrar as coisas que acontecem da perspectiva dos vencidos, dos “esfarrapados do mundo”, dos considerados como párias pela sociedade, daqueles, enfim, que não têm tido espaço nos veículos “oficiais” para expressar os seus anseios, as suas dores, as suas expectativas.
Bom trabalho!