LARS VON TRIER E O SEU “ANTISSEMITISMO”

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A coletiva de imprensa do cineasta dinamarquês Lars Von Trier dada nesta quarta-feira (18), logo após a exibição do seu filme “Melancolia”, que concorre na Mostra Competitiva do Festival de Cannes, foi uma das principais notícias da semana. Lars, de origem judaica, disse que compreendia Hitler e acabou sua fala com um “Ok, I’m a nazi” [“Ok, eu sou um nazista.”].

Em um instante a mídia esqueceu a controvérsia gerada pelo filme “A Árvore da Vida”, de Terrence Malick, com Sean Penn e Brad Pitt. O filme, simultaneamente aplaudido e vaiado após sua apresentação no Festival, chegou a ser comparado com “2001 – Uma Odisseia no Espaço” por alguns e julgado totalmente dispensável por outros.

Certamente o comentário de Lars Von Trier foi o principal assunto do Festival de Cannes, que se encerra neste domingo (22). Saiu em todos os jornais pelo mundo, sendo considerado por alguns um ato de suicídio profissional do cineasta. Sua saída de cena, no entanto, é algo difícil de ser imaginado quando lembramos que foi Trier, juntamente com Thomas Vinterberg, um dos principais responsáveis pela visualização que o até então quase desconhecido cinema dinamarquês teve após o lançamento do Dogma 95, manifesto que pregava um cinema mais realista e com menos aporte técnico, diferente dos padrões hegemônicos de Hollywood.

Porém, por que a mídia deu tanta relevância para a resposta de Lars Von Trier? Era para tanto? Certamente não. A fala do cineasta carregava um tom visivelmente irônico, que foi excluído nas edições dos jornais impressos e televisivos que noticiaram o fato, que publicaram apenas as frases mais impactantes da fala: “Eu entendo Hitler. Acho que ele fez coisas erradas, mas posso imaginá-lo sentado em seu bunker” e “Ok, eu sou um nazista”.

A pergunta que gerou a polêmica tratava das raízes alemãs do cineasta e a utilização de música germânicas em seus filmes. A resposta na íntegra de Von Trier, na íntegra, foi:

“A única coisa que posso dizer é que pensei ser judeu por um longo tempo e era muito feliz em ser judeu. Então conheci Susanne Bier [cinegrafista judia] e, de repente, não estava mais tão feliz em ser judeu. Isso foi uma piada. Desculpem. (risos) Mas acabou que eu não era judeu. Se eu fosse judeu, seria de segunda geração, mas, seja como for, eu realmente queria ser judeu – e então descobri que era nazista porque minha família era alemã. E isso também me trouxe certo prazer. (risos) Então, o que posso dizer? Eu entendo Hitler. Acho que ele fez coisas erradas, mas posso imaginá-lo sentado em seu bunker. Eu acho que entendo o cara. Ele não era o que poderíamos chamar de um bom sujeito, mas, sim, eu o entendo bastante e simpatizo com ele. Mas esperem aí! Eu não sou a favor da Segunda Guerra Mundial. E não sou contra judeus. Nem mesmo contra Susanne Bier (risos). Sou a favor deles, mesmo que Israel seja um pé no saco. Com relação à arte, sou a favor de Speer. De Albert Speer [arquiteto nazista que planejou a reconstrução de Berlim e tornou-se Ministro do Armamento do III Reich] eu gostava. Ele era um dos melhores filhos de Deus. (risos) Ele tinha um talento que… Tudo bem, chega! Como escapo desta última frase? (suspiro) Ok, eu sou nazista“.

Coletiva de imprensa no Festival de Cannes (Foto: Internet)

O comentário certamente foi infeliz, disso não restam dúvidas. Mas antes disso, foi irônico! De uma ironia que todos perceberam, mas resolveram ignorar. A entrevista já vinha nesse tom desde antes da pergunta fatídica. Lars já havia mencionado, por exemplo, que seu próximo filme seria um longa de 3 a 4 horas com muitas cenas de sexo para Kirsten Dunst e Charlotte Gainsbourg e que elas teriam dito que os diálogos entre uma cena e outra não seriam importantes. Mas, como já foi dito, todo o resto da entrevista foi ignorado.

O fato é que o comentário gerou reações quase que espontâneas. Os organizadores do Festival consideraram Lars Von Trier persona non grata, o que impediria de receber o prêmio, caso seu filme ganhasse a Mostra, algo que, agora, mostra-se quase que impossível.

A indústria cinematográfica é comandada por judeus. A afirmação não é exagero.  Se formos pegar apenas o caso de Hollywood, maior indústria de cinema do mundo, veremos como os judeus dominam os altos escalões: os presidentes da Fox Entertainment Group, da Paramount Pictures, da Sony Pictures, da Warner Brothers, da MGM e os diretores executivos da Walt Disney, da CBS e da Universal Studios são judeus, por exemplo. Além disso, um grande número dos executivos, produtores, diretores e roteiristas de Hollywood também são judeus. Na década de 80, um estudo mostrou que entre 80% da produção para cinema e televisão nos EUA estava na mão de judeus. O número é bastante alto, se formos levar em conta que na época apenas 3% da população estadunidense era judia (esse número hoje não passa de 1,3%).

O mesmo acontece com o maior número das redes de televisão, grandes jornais e revistas dos Estados Unidos.

No Brasil não é diferente. As famílias à frente das maiores redes de comunicação a nível nacional, como as Organizações Globo, e mesmo regional, como o Grupo RBS, são de origens judias. Isso, obviamente, não se configura em um problema por si só. O problema surge quando um grupo que tem em suas mãos a hegemonia dos meios de comunicação de massa acaba por mostrar apenas o seu ponto de vista sobre questões polêmicas, como o conflito entre Israel e Palestina.

Na mídia, geralmente confundem-se os conceitos de antissemitismo e antissionismo e eles são abordados como sendo manifestações semelhantes. Na verdade, enquanto o antissemitismo é o preconceito contra os judeus baseados em questões religiosas, culturas e étnicas, muitas vezes manifestada junto com a negação do Holocausto, o antissionismo é o posicionamento contrário à política sionista, representada pelo Estado de Israel e suas práticas belicistas, geralmente acompanhadas pela violação dos direitos humanos para com o povo palestino.

A mídia hegemônica, porém, acaba colocando as duas manifestações no mesmo barco. Para ela, não há fala antissionista que não seja antissemita. Porém a crítica ao modo de fazer política do Estado de Israel não é necessariamente uma crítica ao povo judeu, até porque nem mesmo dentro da própria comunidade judaica as atitudes do governo israelense são totalmente aceitas, como mostra o documentário “Difamação” , de 2009 .  (Para ver o documentário completo, online e legendado, clique aqui)

O documentário exibido no 16º Festival Internacional de Documentários – É tudo verdade, no Brasil, mostra como alguns judeus usam o antissemitismo de forma política para benefícios próprios.  O documentarista Yoav Shamir, ele mesmo israelense e judeu, que diz nunca ter presenciado um ato real de antissemitismo, pesquisou como o sofrimento dos judeus que padeceram no Holocausto é usado hoje em dia. Assistindo ao filme, chega-se à conclusão de que o Holocausto é tido hoje em dia para muitos judeus como uma forma de desculpa, uma licença para agirem como bem entenderem. E para que essa ideia prevaleça, é necessário que o antissemitismo esteja sempre em pauta.

A repercussão dada à declaração infeliz de Lars Von Trier é um exemplo disso. Uma fala irônica, usada de maneira sensacionalista, que acabou criando um fato que certamente não merecia tanta atenção. “Isso foi uma coisa ridícula de dizer, é claro, mas o que eu quis dizer é que não concordo com a política externa de Israel, o que não é algo que possa me converter em ‘persona non grata‘. Acho.”, disse o cineasta em uma entrevista.

A Liga Anti-Difamação (LDA), organização estadunidense criada em 1913 para combater o antissemitismo e citada por vários estudiosos como um dos principais veículos de lobby judaico, rapidamente postou uma resposta ao cineasta

“Lars Von Trier parece ter problemas com alguns fantasmas pessoais de seu passado, porém ele escolheu o caminho errado para resolvê-los. Foi uma explosão bizarra, em que ele fez piadas inadequadas e chocantes sobre nazistas e o Holocausto (…).

Hitler, os nazistas e o Holocausto são questões que devem ser tratados com seriedade, e não sátira. É irônico que os comentários de Von Trier tenham sido feitos na ocasião do Festival de Cannes, que foi criado em 1930 em resposta à intervenção fascista no cinema.

A explosão de Von Trier é apenas o último de uma série de incidentes recentes envolvendo celebridades que parecem chegar a um momento de crise em suas vidas e usam do Holocausto ou se envolvem em jogos de palavras antissemitas.

É lamentável e preocupante que os judeus continuam a servir de bode expiatório para todos os tipos de conflitos pessoais. Esperamos sinceramente que Von Trier reconsidere as suas palavras, que em última análise, serviram para banalizar o Holocausto em um fórum público, onde claramente este tipo de desabafo não tem lugar.”

A Liga Anti-Difamação foi certeira em sua nota, porém o documentário “Difamação” (o nome do documentário é uma referência direta à organização) faz um estudo muito interessante sobre como a LDA foi desviada de suas missões iniciais para se tornar um órgão político que serve a interesses particulares. É interessante assistir ao documentário na íntegra, disponível no Youtube.

Lars Von Trier errou, exagerou e não mediu os riscos de usar sua ironia, tão presente em seus filmes, em uma entrevista com os maiores veículos de comunicação do mundo. Como consequência, pode ter perdido seu segundo prêmio no Festival de Cannes – ele já havia ganhado em 2000 por “Dançando no Escuro”.

Tatuagem de Lars von Trier: "FUCK"

Em nota, o cineasta pediu desculpas ainda no mesmo dia: “Se eu ofendi alguém esta manhã com as palavras que disse na coletiva de imprensa, peço desculpas sinceras. Não sou antissemita ou racista de qualquer maneira, e muito menos nazista”. Porém, em uma entrevista logo após, disse: “Pedir desculpas é algo que acho um pouco desagradável, porque pedir desculpas não resolve nada. Acho que pedir desculpas é uma coisa muito americana. Não muda nada, é muito fácil e é totalmente sem conteúdo. Não, eu não peço desculpas, mas lamento se causei dor a algumas pessoas. Não foi essa minha intenção.”

Lars provavelmente esteja realmente arrependido. Ou talvez esteja satisfeito, porque, de uma forma ou de outra, sua declaração foi um grande golpe de marketing para seu novo filme. Agora resta esperar para ver se, embora derrapando em coletivas de imprensa, Lars Von Trier continua certeiro em seu cinema.

LARS VON TRIER E O SEU “ANTISSEMITISMO“, pelo viés de Felipe Severo

felipesevero@gmail.com

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