E se a taça Jules Rimet não foi derretida? E se ela está guardada para deleite e apreciação de poucos?
Manuscritos de 1991, autoria anônima
Revisado e ampliado em junho de 2010 por João Victor Moura
É difícil de se acreditar nessa possibilidade. Poucos acreditam, inclusive. Entre estes está o que aqui escreve. Abalado pela história de Juan Carlos para a revista Visão de 1989 saí a procura de dados, fatos, documentos e pessoas que pudessem revelar o verdadeiro paradeiro da taça mais importante do futebol brasileiro.
Envolto em muito mistério, esta história não parecia fácil de ser remontada. O assalto e tudo que ele deu origem. Pela primeira vez uma versão alternativa dos acontecimentos é contada.
RETROSPECTIVA DOS FATOS
Em 1970 o Brasil ganhava definitivamente a taça Jules Rimet, objeto mor de consagração do futebol nacional. A taça foi entregue ao capitão Carlos Alberto Torres e trazida para o Brasil. Depois de ser exposta nas principais capitais do país, a taça foi levada para sede da CBF, onde ficaria em definitivo. No nono andar da Confederação foi armada uma área especial para a taça, exposta em um pedestal junto com outras três taças. Ali, protegida por um vidro à prova de balas, ela permaneceria para regozijo nacional para sempre. No entanto, em 1983 a taça foi subtraída e nunca mais foi vista. A reportagem de Glória Maria produzida na época narra os fatos.
Pressionada pelos meios de comunicação e pelo apelo popular, a polícia dirigiu grande efetivo para caça incessante dos culpados. Na busca Antonio Setta foi preso e entregou Sérgio Pereira Ayres, o Peralta, suposto idealizador do assalto. Setta disse a polícia que foi convidado a participar da ação por Peralta, mas que não aceitou. Peralta foi encontrado e preso. Depois de três dias de torturas e sem comer, admitiu sua participação na ação. Além disso, acabou entregando os nomes de seus comparsas: Francisco José Rocha Rivera, o Chico Barbudo; e José Luiz Vieira da Silva, o Luiz Bigode. Juan Carlos Hernandes seria acusado de participação dias depois, sendo ele preso como comparsa. Juan Carlos era joalheiro e, conforme o depoimento de Peralta, era o dono do equipamento usado para derreter a taça, transformada em barras de ouro.
Em entrevista concedida à revista Visão em 1989, Juan Carlos nega participação na ação e diz que foi pago para confessar: “A história já tava inventada e a taça tinha que desaparecer (…) fui pago pra dizer que derreti a tal taça”.
O PLANO
Pouco tempo depois, Juan Carlos teve o mesmo fim da taça Jules Rimet, desapareceu para sempre. Tantos anos passados, a história fica cada vez mais esquecida. Não vende mais jornal ou dá audiência na tevê. A taça também desapareceu da mídia. Mas por que tal enredo, de filme hollywoodiano deixou de ser veiculado? O plano descoberto por nossa equipe revela as verdadeiras motivações para a história sumir.
Inverno no Rio de Janeiro. Na semana mais fria do ano, Sérgio Pedro Ayres, o Peralta, encontra-se com um emissário misterioso. Com uma proposta audaciosa, roubar a Jules Rimet da sede da CBF. O dinheiro é bom, e os riscos são poucos. A ação seria simples e pouca gente teria que se envolver. Peralta, um ladrão sempre com pouco dinheiro, aceita participar, sem saber para quem trabalhava.
Anos antes, em 1970, muitos se aproximavam da taça, se interessavam por ela, mas apenas um parecia hipnotizado pelo objeto de ouro maciço. Dias depois diria para colegas, em tom de brincadeira: “Essa taça bem que podia ficar lá em casa”. Poucos acreditavam haver verdade no dito, mas não ele. Ele queria a taça, precisava dela.
Chico Barbudo e Luiz Bigode já se conheciam de outros furtos. Peralta era conhecido deles, mas, sempre desconfiado, não depositava fé na dupla de almofadinhas. Mas uma coincidência os juntou num dos roubos mais misteriosos do século, o almoço do Restaurante Comercial, bem no centro do Rio de Janeiro.
Comida barata, muito espaço distribuído no ziguezague do balcão. Ali se encontravam a massa de funcionários do centro e a bossa da malandragem suburbana carioca, os ladrõezinhos mais famosos e apelidados do submundo da cidade. Mais uma quarta-feira de casa cheia. Poucos lugares à vista. Peralta segue entre clientes e balcões sem saber que o seu destino era encontrar Barbudo e Bigode. Ainda sem parceiros para a ação planejada, ele se senta para pedir o prato-feito de frango, batata e um chope garotinho, mesmo sendo meio-dia de quarta.
Ao sentar, logo reconhece seus vizinhos de balcão. Estão ali para mais um pequeno furto, só pra pagar a conta. Sentam-se separados, com um lugar no meio. Enquanto um deles distrai o cliente, o outro fica com o que ele tiver nos bolsos das calças. Truque antigo, que Peralta já conhece bem. Num aperto de mão se cumprimentam e começam a conversar. Peralta agradece aos céus por ter encontrado aqueles dois. Tem um trabalho irrecusável.
Passam-se as semanas, e o plano começa a ser arquitetado. Tudo com supervisão do desconhecido, por meio de seu emissário. Os ladrões tem informações privilegiadas vinda do emissário. Sabem os horários dos vigilantes, como também conhecem a fragilidade da segurança das taças. Elas estão no nono andar, protegidas por um vidro à prova de balas. No entanto, o fundo do vidro é pregado na parede, ou seja, o simples uso de pés-de-cabra resolveria a situação rapidamente.
O plano é simples: entrar pelos fundos do prédio no início da noite, render o vigilante e subir pelo elevador os nove andares até a taça. Lá, prendem o vigilante que a esta altura já está amordaçado e vendado. Com os pés-de-cabra retiram pelo fundo a redoma de vidro. Com as taças em mãos, seguem para o elevador e se separam ao sair pelos fundos do prédio.
A FUGA
A ação saiu assim como o planejado. Depois de alguns dias, os ladrões se encontraram. Peralta já estava com uma parte do dinheiro pago pelo trabalho. A outra parte viria com a entrega das peças. O emissário apareceu em pouco tempo, e sem muita cerimônia entregou o dinheiro para os três homens e saiu com as taças. Que nunca mais seriam vistas.
O plano era perfeito, só não levava em conta a comoção popular que um roubo desses causaria. A imprensa questionava as autoridades, incapazes de proteger um símbolo do país. E alguém precisava ser o bode-expiatório. Antônio Setta, outro conhecido ladrão foi pego pela polícia. Não por acaso. Setta foi pago pelo homem misterioso para ser pego e indicar Peralta como culpado. Uma denúncia anônima levou os agentes até ele, que, como o planejado, entregou Peralta. Três dias e uma misteriosa ligação depois, Peralta confessava o crime e entregava seus comparsas. A história seria construída depois. Havia tempo para isso. Chico Barbudo e Luiz Bigode também receberam ligações misteriosas. Assumiam a autoria minutos depois. Não só isso. Também entregavam um quarto comparsa, o argentino Juan Carlos Hernandes, que teria derretido a taça. Juan Carlos já estava avisado da situação. Seria preso, mas responderia ao caso em liberdade. A condenação era certa, mas daria-se um jeito dele desaparecer sem cumprir a pena, assim como todos os outros envolvidos.
E assim aconteceu. Peralta nunca disse quem era o contratante do trabalho para a imprensa. Essa versão foi logo enterrada, mas fatos no mínimo curiosos aconteceram. Antônio Setta, possível contratado para entregar Peralta, morreu dois dias antes de depor no tribunal num acidente até hoje não explicado. Chico Barbudo morreu depois de condenado e foragido, numa briga de bar que também não foi explicada até hoje. Já Juan Carlos, o maior dos bodes-expiatórios, que recebeu pra confessar o crime que não cometeu, desapareceu depois da entrevista para a revista Visão onde contava tudo o que sabia sobre o caso.
O homem que encomendou a taça estaria acima de qualquer suspeita. Sua piada em 70 poderia entregar suas pretensões, mas pouco acreditariam que o dono de um grande grupo de comunicação, que tanto apoiou o Brasil, seria capaz de um ato desses. Um ato megalomaníaco até hoje acobertado pela mídia e pelo governo.
A taça Jules Rimet repousa ao lado de outros troféus e condecorações, numa grande estante de madeira de lei no subsolo da mansão no Cosme Velho, Rio de Janeiro.
[Junho de 2010: o texto acima nunca foi publicado. Os motivos variavam entre a descrença e o medo de represálias. A revista o Viés o publica com exclusividade, junto da entrevista de Juan Carlos Hernandes para a extinta revista Visão.]
“Esse texto é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com fatos ou pessoas reais não passa de mera coincidência.”
O REAL PARADEIRO DA TAÇA JULES RIMET, pelo viés de João Victor Moura
joaovictormoura@revistaovies.com
Para ler mais contos e reportagens acesse nosso Acervo.
Este texto diz o que entendi? Que foi o Roberto Marinho que encomendou o roubo da Taça Jules Rimet, e ela está escondida na mansão dos Marinho?
Esse texto é uma obra de ficção.
Qualquer semelhança com fatos ou pessoas reais não passa de mera coincidência.
Jogar a culpa nos marinhos e outra saida para o bandido, O homem que se acha dono da taça e que a roubou foi derigente da C. B. F; teve como comparça seu genro tambem derigente ?
Pra mim a verdadeira taça ainda está na Inglaterra.
Há indícios de que dirigentes ingleses não devolveram a
Jules Rimet verdadeira, antes de 70. Teriam contratado um
artesão italiano para criar uma réplica quase perfeita,
embora menos valiosa. Quando a Fifa solicitou a taça
para a Copa do México, a devolvida teria sido a réplica,
erguida por Carlos Alberto na conquista do Brasil.
Ou seja, o sumiço da JR em 83 serviria para que nunca
se pudesse fazer uma análise da mesma.
Tudo isso e mentira a taça foi mesmo derretida
Sob um certo aspecto a CBF teve uma parcela de culpa no roubo da Jules Rimet original por relaxamento: era ela que deveria estar fortemente guardada, enquanto a réplica ficaria exposta à visitação pública.